Errei muito antes de perceber a importância que a gestão de expetativas tinha na relação com os clientes. Hoje procuro logo nos primeiros pontos de contacto com um potencial cliente, analisar, orientar e gerir expetativas. Hoje sei que as expetativas devem estar alinhadas entre mim e o cliente e/ou parceiro. Mas durante muito tempo não foi assim, desconsiderei a sua importância e cometi erros, é também sobre isso que gostaria de falar neste artigo.
Podia ter escolhido um assunto mais técnico – e talvez até mais relevante para a audiência – haverá outras oportunidades para isso, mas quando recebi o convite para aqui escrever, tinha tido uma conversa recente em que me tinham dito qualquer coisa como “lá estás tu com a conversa das expetativas”. A frase foi dita em tom de brincadeira, mas inspirou-me a escrever sobre isso.
Escrever este artigo não vai ajudar a mudar essa imagem, mas não me importo nada que venha a ser adjetivado como o “fanático das expetativas”.
Quem trabalha comigo já me ouviu com certeza a dizer: “temos que gerir as expetativas”; “assim não vamos cumprir as expetativas do cliente”; “desculpe, mas essas expetativas são irrealistas”; (…). Não estou a tentar assumir a autoria destas expressões, todos nós as dizemos, mas há uma distância entre dizer e ter uma real preocupação com o assunto.
Define-se expetativa como a “esperança baseada em supostos direitos, probabilidades, pressupostos ou promessas”, “ação ou atitude de esperar por algo ou por alguém, observando” (Dicionário Priberam).
Pressupostos e Promessas
Pressupostos e promessas alimentam todas as relações.
Em relação aos pressupostos é algo do qual temos menos controlo. Muitas vezes reunimos com um cliente que traz consigo pressupostos errados (ou diferentes daqueles que pensamos serem certos) e que nos levam a ter que dedicar tempo e energia a orientá-lo para o caminho certo. E isto tudo acontece, por vezes, antes de ganharmos o primeiro euro.
Não podemos menosprezar a importância de educar e informar o cliente. Os pressupostos podem estar errados apenas porque alguém lhe disse que era assim que se fazia ou leu “em qualquer lado” que alguém tinha conseguido ter sucesso de determinada forma.
Quanto mais informado estiver o nosso cliente, mais fácil será trabalharmos em conjunto. Por outro lado, e ao contrário do que alguns profissionais pensam, quanto menos o nosso cliente souber sobre o nosso trabalho, em regra, menos o vai valorizar e mais frágil será a relação.
É um grande erro ignorar os pressupostos. Às vezes estamos com pressa e tentamos concluir a reunião sem antes ter conseguido passar a mensagem que pretendíamos ao cliente e despedimo-nos com um “eu depois envio-lhe a proposta por email”. Mas o briefing foi bem transmitido? Conseguimos dar resposta a tudo o que está no briefing? Não temos nenhuma sugestão de alteração? Ficou claro para nós aquilo que o cliente pretende e ficou claro para o cliente o método, a estratégia e os canais que pretendemos adotar?
Será que nos preocupamos realmente em garantir que as expetativas do cliente estão alinhadas com as nossas?
O tempo que dedicarmos nesta fase, podemos vir a ganhar em dobro ou em triplo mais à frente (no caso de fecharmos negócio). Assim, tentamos evitar ter o cliente a dizer-nos depois de iniciarmos a prestação do serviço de que “não era bem isto que estava à espera”.
Em seguida temos as promessas. Ninguém gosta que lhe prometam algo que depois não é cumprido. Porque continuamos com tanta leviandade a prometer coisas que depois não cumprimos?
A facilidade nos negócios com que ouvimos como argumento de venda “posso prometer-lhe que depois de começar a trabalhar connosco (…)”. Temos que tentar parar com isto.
Podemos prometer tempo e dedicação ao cliente, mas, mesmo assim, aconselho cautela na forma e nas expressões a utilizar.
Será que é racional dizer que “se trabalhar connosco vamos estar sempre disponíveis”. Não estaremos a alimentar uma falsa expetativa, uma vez que não vamos estar verdadeiramente “sempre disponíveis”?
Dir-me-ão alguns de vocês que estou a dramatizar e que por vezes “é uma força de expressão”. A verdade é que o problema não está propriamente na expressão, mas sim na mensagem que passamos ao cliente e na forma como a mesma poderá ser interpretada.
Esta ideia fantasiosa de alguns clientes que nos pagam uma avença mensal para prestarmos determinado serviço e que, por isso, temos que estar “sempre disponíveis” a qualquer hora em qualquer lugar, somos nós que a alimentamos. E depois andamos a lamentar-nos porque “o cliente não nos paga o trabalho que nos dá” ou “o cliente acha que trabalhamos só para ele”.
Reconheço que, cada caso é um caso, e não estou com isto a dizer que devemos ignorar as chamadas dos nossos clientes (isto sou eu agora a proteger-me dos meus clientes que podem eventualmente ler este artigo). Estou apenas a pedir que tenhamos maior bom senso naquilo com o qual nos comprometemos. E no caso daquilo que nos comprometermos for efetivamente “estar sempre disponível”, então que alinhemos as expetativas e que sejamos remunerados de forma justa.
Sejamos todos um pouco mais racionais e equilibrados nos discursos que temos com os nossos clientes e potenciais clientes.
Como devem ter reparado, deixei de fora as promessas mais técnicas relacionadas com a nossa atividade profissional (no meu caso, marketing), porque isso levaria a outra discussão se podemos prometer a um cliente que vamos conseguir posicionar o site do cliente no 1º lugar no Google, que vamos gerar-lhe X vendas ou X% de taxa de conversão. Não façam isso se não conseguem garanti-lo, estarão a alimentar falsas expetativas que serão utilizadas como critério principal para avaliar o sucesso do vosso trabalho.
De cada vez que não cumprimos as expetativas que criamos junto de um cliente, não nos estamos a penalizar só a nós, estamos a contribuir para uma imagem negativa que aquele cliente terá do nosso setor.
É por isso que algumas pessoas antes de levarem o automóvel ao mecânico já acham que vão ser enganadas ou antes de irem ao dentista já pensam que vai doer. Provavelmente, mais do que uma vez, tiveram expetativas que foram defraudadas com más experiências.
Os Principais Erros que Cometi
Falhei muito e continuo a falhar (felizmente muito menos do que antes) na gestão de expetativas. Às vezes por orgulho, outras vezes por ingenuidade. Umas vezes por dinheiro, outras por mera ambição desmedida.
Estes são talvez os 4 principais erros que cometi na gestão de expetativas:
1. Comprometer-me com algo que sabia logo à partida que teria muita dificuldade em cumprir.
E não estou com isto a dizer que devemos deixar de ser ambiciosos e não abraçar grandes projetos que nos façam querer dar o salto. Mas que esse salto nos permita cair de pé e que, mesmo que magoados com a queda, não falhemos com o cliente.
Um potencial cliente pede para executar um projeto num timing que é praticamente impossível conseguir cumprir. Se é impossível por uma questão do tempo que demora a sua execução, então que mantenhamos a nossa posição firme e que não aceitemos o projeto.
Se for por uma questão de falta de espaço na agenda, podemos procurar envolver outros parceiros ou até sugerir ao cliente outras soluções externas.
2. Achar que conseguia mudar a ideia do cliente a meio do caminho.
Podemos ter uma ideia diferente da do cliente e não quer com isso dizer que a nossa seja a mais acertada, mas é importante antes de iniciar a viagem, saber qual é o destino.
É muito arriscado achar que vamos conseguir convencer o cliente a meio do processo a mudar de opinião. E se não conseguirmos?
Por isso, antes de se iniciar a viagem, discute-se o destino. Se eventualmente não conseguirmos chegar a um consenso, talvez seja melhor cada um seguir o seu caminho.
3. Ceder em relação a algo que acreditava que não ia funcionar.
No início dos nossos negócios é natural que tenhamos que ser mais flexíveis para conseguir angariar determinado cliente. Nem sempre deveríamos fazê-lo, mas a verdade é que abdicamos de alguma racionalidade para conseguir fechar alguns negócios.
Acabamos por perceber que é muito mais difícil trabalhar com um projeto ou com uma estratégia em que não acreditamos no seu sucesso.
Devemos ser humildes para reconhecer que existe sempre margem para descobrir e explorar oportunidades que desconhecemos, mas devemos também ter a capacidade de dizer que não nos sentimos confortáveis a trabalhar desta forma e/ou com este projeto.
4. Não calcular corretamente o tempo necessário.
Já falei um pouco sobre a importância de gerir a nossa disponibilidade para o cliente. É um grande desafio o processo de planeamento e cálculo do tempo necessário para cada projeto.
Muitas vezes apresentei orçamentos sem fazer um correto planeamento das tarefas necessárias para a execução de cada serviço e com o cálculo das horas necessárias para cada tarefa.
Como consequência, acabamos por não dedicar o devido tempo ao cliente (porque podemos não ter capacidade para dar resposta) ou dedicamos tempo demais para a remuneração que recebemos (a responsabilidade é nossa, uma vez que fomos nós que apresentámos o orçamento).
Haverá mais erros para identificar e novos erros são cometidos todos os dias, mas acredito seguramente que uma correta gestão de expetativas de parte a parte pode prevenir e evitar muitos deles.
Gestão de Expetativas no E-Commerce
Levo também esta abordagem para as estratégias de marketing dos nossos clientes e procuro sensibilizá-los de que só temos a perder em comunicar mais do que aquilo que podemos garantir que conseguimos entregar ao cliente.
Quantos de nós já reservámos um quarto de hotel com a expetativa daquela fotografia que vimos online e quando chegamos presencialmente ao quarto ele parece mais pequeno ou a vista não é bem a que nos venderam. Ou encomendamos um produto online que quando recebemos em casa não corresponde exatamente àquilo que esperávamos.
Mais uma vez, está tudo relacionado com gestão de expetativas.
Um cliente que compra um produto ou serviço online e sente-se frustrado porque não cumpriu as expetativas, dificilmente volta a repetir a compra. Aquilo que nós vendemos não é assim tão exclusivo que ele não possa procurar outras alternativas que o deixem mais satisfeito.
A má gestão de expetativas no e-commerce não se aplica apenas às características do produto. No caso da logística, o não cumprimento do prazo de entrega ou o preço dos portes de envio apresentados apenas no final da compra, são fatores que levam o cliente a sentir-se frustrado.
A ausência da informação descritiva sobre o produto, o processo de entrega, a política de devoluções, entre outros, são tudo fatores que aumentam a desconfiança do cliente e que não contribuem positivamente para a gestão de expetativas.
Conclusão
Manter o cliente informado, ser transparente e ter a capacidade de apresentar soluções em vez de problemas, são formas de prevenir e antecipar possíveis problemas.
Será difícil que a realidade corresponda sempre à expetativa, até porque cada pessoa tem comportamentos e expetativas diferentes. Depende de nós analisar, orientar e gerir essas expetativas.
Luís Torres
CEO da SlyUp
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